o terror como arte
Muita tinta tem corrido para comentar a fotografia do ano do World Press Photo que, como é já de conhecimento geral, é referente ao momento dramático em que um atirador, em plena Galeria de Arte Contemporânea de Ancara, disparou sobre o embaixador da Túrquia, matando-o.
O autor da fotografia é o turco Burhan Ozbilici, que estava aparentemente de passagem pela galeria e deparou-se com tal situação e ante o medo que sentia, optou por disparar a sua objetiva incessantemente obtendo diversas imagens do momento, entre as quais a considerada fotografia do ano.
Tenho várias considerações a fazer sobre tal momento e até sobre o prémio em si; primeiramente de referir que o atirador era um agente sírio do corpo de intervenção da polícia de Ancara e então pergunto: «como é feito o processo de recrutamento nesta polícia?», «como são analisados os destacamentos dos agentes para determinadas situações?».
Colocar este agente a acompanhar e, de alguma forma com o dever de proteger, o embaixador sendo ele de origem síria, com tudo o que se tem vivido na Síria, quem sabe se este jovem de 22 anos não estava de facto no limite? Quem sabe se alguma da sua família não estava em fuga do seu país ou até tivessem morrido no mediterrâneo como tantos milhares… São tudo suposições, mas plausíveis, que não justificam de todo o ato mas ajudam a tentar perceber motivações.
Claramente que não seria a pessoa mais indicada, de toda a equipa existente, para ser destacada para tal função.
Quanto à fotografia premiada especificamente, podem ser feitas diversas análise no ponto de vista estético, artístico ou mesmo no que concerne á coragem do jornalista, no entanto, não deixa de ser é um momento negro, a morte parada no tempo, num instante em que se pode ver tudo o que aconteceu, a surpresa, a loucura.
Uma imagem que apresenta e reproduz a atualidade, os tempos de medo e terror que se vivem.
Ouvem-se comentários depreciativos como que a indicar que o facto de esta ser a fotografia do ano pode incitar ao terrorismo. De facto um ato de terror quando ocorre é para ser difundido, e elegendo esta foto poderíamos de alguma forma estar a pactuar com o terrorismo, não obstante esse ponto de vista creio que o mais grave não é o encorajamento ao terrorismo que a foto pode causar mas sim o simples facto desta demonstrar a realidade, o terrorismo que já existe e faz parte do nosso dias-a-dia, a imprevisibilidade da vida atual.
Esta fotografia não vem mostrar ao mundo nada de novo, não vem dar a conhecer uma realidade oculta, não!, vem sim mostrar o que está a acontecer.
E tal comprovação é chocante porque demonstra cada vez mais o caminho que o mundo e a humanidade estão a levar, a rutura a que estamos a chegar; e se, tal foto, ganhar o prémio de melhor do ano não chocasse então sim estaríamos num ponto de loucura.
Pessoalmente não concordo com atribuição do prémio face à panóplia de fotografias existentes e que valorizo mais, no entanto, não condeno a atribuição do mesmo, não é uma foto sugestiva nem incentivadora é simplesmente um retrato real, do mundo em tempo real. É este cenário que se vive, por tantos outros lados, dentro e fora de galerias de arte.
Citando o jurado do WPP, João Silva, “Vejo o mundo a caminhar em direção a um abismo”, e este facto faz-nos crer que já não conhecemos bem as pessoas que nos rodeiam, com quem lidamos, que facilmente poderão entrar no ponto de rutura e ‘explodir’, sem motivo aparente, como aliás, vemos diariamente nos N/telejornais.